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Urbanização intensa: Recife enfrenta desafios e oportunidades em meio ao crescimento populacional e expansão imobiliária

Apesar da queda populacional, a capital pernambucana continua atraindo investimentos massivos, enquanto busca soluções para melhorar a infraestrutura e preservar áreas vulneráveis.

Por Evandro Lira

 

A construção de novos prédios cada vez mais próximos um do outro no Recife passa a sensação de que o espaço urbano está ficando cada vez menor e qualquer terreno disponível é alvo de disputa por construtoras, que implantam cada vez mais condomínios e hotéis pela capital. O Recife possui uma área de 218 km² e não é nem de longe a maior cidade de Pernambuco, sendo completamente ocupada e sem muitos espaços para novos habitacionais.

De acordo com a Prefeitura do Recife, o município possui um índice de habitação de 100% e é a 12ª cidade brasileira mais densamente povoada, com 6.803,6 habitantes/km². De acordo com o Censo de 2022, formulado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população da capital chegou a 1.488.920 pessoas, o que representa uma queda de -3,17% em comparação com o Censo de 2010.

Mesmo com uma queda no número de moradores, o Recife continua como a cidade mais povoada do estado, ficando em 3º na região Nordeste e em 9º lugar em âmbito nacional. A pesquisa feita pelo IBGE ainda mostra que a capital tem uma média de 2,7 moradores por residência.

Mesmo com uma redução no quantitativo de moradores, o Recife é uma janela de oportunidades para construtoras e empreendedores, uma vez que a cidade tem o maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita do Nordeste, segundo relatório do IBGE. Somando 2021, 2022 e 2023, o Recife realizou o maior ciclo de investimentos da década, reunindo aportes de mais de R$ 1,5 bilhão.

Processo de urbanização no Recife

Entre as décadas de 1940 e 1970, a população do Recife saltou de 348.424 para 797.234 habitantes, representando um crescimento de 128,8% (Foto: Rafael Vieira/DP)

Entre as décadas de 1940 e 1970, a população do Recife saltou de 348.424 para 797.234 habitantes, representando um crescimento de 128,8% (Foto: Rafael Vieira/DP)

A ocupação no Recife teve início no século XVII. Em 1630, a cidade era formada apenas por um porto natural de onde saía o açúcar para a Europa. No Bairro do Recife viviam pescadores que também atuavam nas atividades de carga e descarga das embarcações.

Enquanto isso, os bairros de Santo Antônio e São José eram apenas uma grande área inundada e cheia de vegetação, com poucas áreas de solo firme. Com a ocupação holandesa, o Recife cresceu rapidamente por conta da área portuária, da movimentação feita pelas tropas invasoras e graças à chegada de moradores de Olinda.

Quando a colonização holandesa terminou, em 1654, o Recife tinha cerca de 8 mil moradores, espalhados por 290 sobrados em uma área de 24,7 hectares. Na região do porto, as residências burguesas se misturavam com o comércio e as atividades portuárias.

Com a expulsão dos holandeses, estruturas religiosas ganharam espaço na área central do Recife e as casas tiveram que se adaptar com a presença das praças das igrejas que competiam pelo domínio dos bairros de Santo Antônio e São José. Já o bairro da Boa Vista se consolidou como o primeiro solo urbanizado do continente americano.

O Recife passa por um processo de modernização na década de 1840 por conta do crescimento da população e novos equipamentos públicos como rede de esgoto, abastecimento, transporte público e construção de vias estratégicas começam a ser colocados para fora do papel.

O projeto desenvolvido pelo engenheiro Saturnino de Brito para implantação de uma rede de esgoto também foi um dos responsáveis pelo aumento do número de moradores da capital. As obras foram executadas entre 1910 e 1920 nos bairros do Recife, Santo Antônio, São José, Boa Vista, Santo Amaro, Espinheiro, Torre, Graças, Madalena, Cabanga, Capunga, Jaqueira, Campo Grande, Afogados, Caminho Novo, Derby, Lucas e Encruzilhada.

Durante a segunda metade do Século XIX, o transporte público do Recife era formado pelo primeiro trem urbano, por veículos de tração animal e um bonde elétrico, que surgiu em 1914. A aprovação de loteamentos na capital também cresceu junto com as outras áreas da cidade e, entre 1923 e 1986, 1.500 loteamentos haviam sido aprovados. Nas décadas de 1930 e 1940, houve uma maior aprovação nos loteamentos do bairro de Boa Viagem, na Zona Sul.

Nos anos 1950, o Recife definiu seu formato urbano atual, impulsionado pelo crescimento populacional decorrente da migração de pessoas do interior do Nordeste e pela eliminação dos mocambos, o que obrigou a população mais pobre a se deslocar para os morros.

Entre as décadas de 1940 e 1970, a população do Recife saltou de 348.424 para 797.234 habitantes, representando um crescimento de 128,8%.

Para onde o Recife vai?

O Recife esbarra em outros municípios da RMR durante expansão urbana (Foto: Priscilla Melo/DP)

O Recife esbarra em outros municípios da RMR durante expansão urbana (Foto: Priscilla Melo/DP)

O território do Recife é composto por morros (67,43%), planícies (23,26%), áreas aquáticas (9,31%) e por Zonas Especiais de Preservação Ambiental – ZEPA (5,58%). O processo de favelização em áreas de morro na capital pernambucana mostra para onde a parte mais pobre da cidade precisa ir para conseguir ter uma moradia.

Recife é a quinta cidade do Brasil com o maior número de pessoas em áreas de risco. Ao todo são mais de 206 mil pessoas em condições vulneráveis, principalmente em encostas de barreiras propensas a deslizamentos.

Áreas mais distantes do centro do Recife ainda não foram totalmente exploradas por construtoras e por pessoas mais vulneráveis. Um exemplo é o bairro de Guabiraba, na Zona Norte da cidade, o maior bairro da capital, com 46 Km², o que o torna maior que o município de Olinda, que tem 40 Km².

A principal característica desta localidade é a preservação da mata atlântica, que dá a sensação de que o bairro pertence a uma cidade do interior do estado. Há alguns anos, o bairro era composto apenas por chácaras e granjas, mas a pavimentação da Estrada da Mumbeca, em 2012, impulsionou a venda de terrenos perto da principal via de acesso.

No entanto, o bairro abriga o Beberibe, maior Unidade de Conservação da Natureza (UCN) do Recife, com uma área de 4.823,38 hectares. O local é monitorado pela prefeitura, que já necessitou retirar invasores da área protegida. Outra zona com poucas construções e também protegida é a Área de Proteção Ambiental (APA) Mata da Várzea, com 713,17 hectares.

 

“No bairro da Guabiraba é possível, sim, construir em alguns lugares, mas para isso é preciso que exista um lote conformado, que naquela área de mata não tem. Mas, é possível ter este lote na margem da BR, em algumas vias mais importantes. A gente também já entendeu que grandes áreas preservadas e sem nenhum tipo de ocupação são áreas que terminam sendo favelizadas ou desmatadas sem que ninguém consiga ver”, explica a presidente do Instituto Pelópidas Silveira, a arquiteta e urbanista Mariana Asfora.

De acordo com Mariana Asfora, o Recife não possui mais áreas de expansão e esbarra em outros municípios. Segundo a arquiteta, o foco é ocupar prédios antigos e abandonados e evitar que as população vá para áreas mais distantes do centro.

“A gente tem um território restrito, alagado, originário dos sucessivos aterros. Entretanto, a gente não tem tanta densidade populacional. Usamos pouco a nossa infraestrutura e essa é uma discussão mundial, não somente o adensamento construtivo, mas o habitacional também. Vamos crescer adensando, ocupando vazios. Estas não são mais áreas de expansão. A gente tem um grande estoque edificado e sem uso no Recife. Fizemos um monitoramento dos terrenos dos edifícios e vamos conversar com os proprietários para que eles deem uso. Esta é a estratégia de adensamento populacional, sem necessariamente construir mais na cidade”, explica a presidente do instituto.

A arquiteta ainda destaca que o Recife se expande para as cidades vizinhas, deixando as fronteiras cada vez menos perceptíveis e aumentando a área metropolitana do estado.

O engenheiro, arquiteto e urbanista Arthur Andrade também destaca que “antes mesmo de pensar na expansão da cidade, a gente precisa resolver os diversos problemas inerentes, como trânsito, mobilidade urbana, saneamento, alagamentos, entre outras coisas”.

“Pensando na expansão, ela não deve se dar somente com a ampliação do tecido urbano.É importante que tenhamos investimentos nos espaços abandonados e que precisam de investimento para que a gente transforme esses espaços e atenda as demandas da cidade”, completa Arthur Andrade.

E os morros?

Nestes locais mais altos, os riscos aumentam e tragédias ambientais podem resultar na morte de centenas de pessoas (Foto: Priscilla Melo/DP)

Nestes locais mais altos, os riscos aumentam e tragédias ambientais podem resultar na morte de centenas de pessoas (Foto: Priscilla Melo/DP)

Os morros do Recife, como em outras partes do Brasil, são habitados por pessoas mais pobres e vulneráveis. Estes locais não costumam possuir edificações complexas por ficarem mais distantes da área central, assim como não estão preparados urbanisticamente para isso.

Nestes locais mais altos, os riscos aumentam e tragédias ambientais podem resultar na morte de centenas de pessoas por conta da falta de preparação do solo. Mesmo assim, segundo o engenheiro, arquiteto e urbanista Arthur Andrade é possível construir com segurança nestas regiões.

“Existem cidades como o Rio de Janeiro que existem construções em áreas de morro e não possuem problemas de deslizamento de terra. É possível ocupar de forma segura a partir de um planejamento, de um projeto de residências, de edifícios. Nos que já estão ocupados, é importante ter atenção, fiscalizando, orientando a população, construindo muros de contenção e investindo em drenagem para que seja viável e possível construir nestas áreas de morro”, explica.

Arthur ainda destaca que no bairro de Aldeia, em Camaragibe, os morros não sofrem com deslizamentos, uma vez que houve planejamento para construção das moradias.

Para o engenheiro ambiental Gabriel Mendes, é importante que haja planejamento antes de expandir as construções nos morros.

“Um planejamento detalhado a partir do Plano Diretor pode definir as áreas verdes que serão protegidas, traçar incentivos à densidade urbana, fiscalizar para controlar o aglomerado de moradias na cidade e preservar as zonas verdes. A gente pode ter uma fiscalização mais eficiente, promover incentivo à preservação com programas que envolvem pagamento de serviços e que valorizem a questão da floresta”, pontua.

De acordo com a gestão municipal, nos últimos três anos, foram concluídas 96 obras de encostas nos morros e está executando mais 56 contenções na cidade. Entre os trabalhos, estão serviços de micro e macrodrenagem, limpeza de canais, contenção de encostas, prevenção e monitoramento em áreas de risco, mutirões e eliminação de pontos críticos de alagamento.

Além disso, no dia 8 de maio, a Prefeitura do Recife assegurou, junto ao Governo Federal, R$ 126,8 milhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) Seleções. Os recursos serão utilizados em sete obras de proteção de encostas e de urbanização de comunidades vulneráveis em diversos bairros da cidade.

 

 

Fonte: Diario de Pernambuco

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